terça-feira, 13 de novembro de 2007

carta de amor, quotidiano e outras estórias

antes de mais digo: não há lugar no espaço do coração para a amarga palavra derrota. Assim como quem diz: amo-te. e quero-te hoje. quero-te amanhã. e as palavras são como a eternidade ou a palavra: eternidade.

antes de mais digo: não há lugar no espaço que ocupamos para a palavra outro. Assim como quem diz: procuro, ainda que de forma imbecil, a intimidade do teu corpo e da tua alma. e a palavra, como intimidade volante.

antes de mais digo: não há lugar para o nada dentro do tudo. Assim como quem diz: já estou farto de mil e uma coisas. a palavra é: nós.

antes de mais (ou depois de tudo) digo: ainda há espaço no lugar que deixamos para nos aninharmos juntos, esquecidos, indiferentes, felizes.

depois de tudo digo: ainda és tu no lugar do sonho. Assim como quem diz: amo-te. descontroladamente. deficientemente. erradamente, tantas vezes. distantemente, ainda muitas vezes. amo-te. no lugar aqui. no interior da casa-sonho dos nossos sonhos.

ainda digo: são infinitas coisas, mas para nós continua a ser apenas necessário um lugar: o lugar. aqui.

sábado, 20 de outubro de 2007

antes de mais, um pedaço de memoria

Não pretendo abandonar sem luta o jogo de acreditar. Ironizo. Como se o precipício fosse um lugar cheio de operários da construção civil e eu pudesse dizer, enfadado, que não há público para a minha morte.

Talvez fosse um olhar apanhado por acaso, no ocaso do dia. Talvez nem fosse o olhar mas o reflexo dos faróis numa memória qualquer. Talvez fosse apenas a vontade de vos dizer: ainda vivo. Talvez fosse morrer.

Não sei se é o corpo cansado ou apenas puro esquecimento. Ou, ainda antes disso, um medo qualquer de qualquer coisa. Podia ser a morte ou apenas a simples palavra. Ou, antes disso, uma qualquer memória. Podia ser, se eu soubesse, podia ser.

Seria necessário escrever, se existissem as palavras, ou se os sussurros que ouço não fossem ramos de árvores passeando-se pela noite. Poderia ser a noite, ou um vazio profundo. Ou, ainda antes de mim, uma criança que chora.

Podia ser que ela vos dissesse: podia ser.